A Lenda da Garça Escarlate de Guaramirim

Há muitos séculos, antes dos trilhos, dos engenheiros e dos vapores cruzarem os rios de Guaramirim, aquele vale verdejante era conhecido pelos povos originários como a Terra da Pequena Garça Vermelha — Guaramirim.

Nessa terra sagrada, entre os rios Itapocu e Itapocuzinho, vivia uma entidade mágica chamada Guará, uma garça escarlate de plumagem reluzente, que não era ave comum, mas sim um espírito guardião das florestas, das águas e do tempo. Segundo os anciãos indígenas, o Guará surgia nas neblinas das manhãs para anunciar tempos de mudança e desaparecia nos galhos das figueiras sempre que a ganância humana ameaçava o equilíbrio da natureza.

Certa vez, quando os primeiros colonos chegaram ao vale em busca de novas terras, trouxeram consigo sonhos, ferramentas… e também o medo. A mata densa, os pântanos e os rios sem fundo pareciam hostis. Dizem que na travessia do Itapocuzinho, os homens de Gustav Doubrawa avistaram uma figura luminosa voando baixo sobre a água. Era o Guará, pairando silencioso, como que dando sua benção — ou advertência.

Na mesma noite, um velho sapateiro chamado Karl Schaefer sonhou com a ave. No sonho, o Guará lhe disse:

“Esta terra só prosperará se houver respeito ao que é antigo, à água que canta e ao barro que forma. Se me traírem com fogo ou ganância, suas colheitas secarão e seus trilhos enferrujarão. Mas se honrarem minha plumagem com trabalho e fé, o vale florescerá.”

Schaefer contou o sonho aos outros, e a imagem do Guará começou a ser respeitada. Os colonos passaram a deixar pequenas oferendas às margens dos rios, uma flor, uma moeda, um pedaço de pão, em troca de proteção e fartura.

Com o tempo, surgiram o Barracão dos Imigrantes, as casas enxaimel, as primeiras escolas e igrejas. O vapor chegou pelo Porto de São Francisco, e a locomotiva cruzou a mata até a Estação de Bananal. Cada nova conquista parecia guiada por uma força invisível, a mesma que os antigos diziam habitar o olhar da Garça Escarlate.

Durante a década de 1930, quando a industrialização acelerou e muitas árvores foram cortadas para alimentar os fornos de cerâmica e engenhos de açúcar, a ave sumiu. Dizem que o Guará se escondeu nas sombras do Morro do Schmidt.

Hoje, moradores antigos dizem que nas madrugadas de neblina, é possível ver um vulto vermelho deslizando por entre os bambuzais do Itapocu. E quando a cidade se une em celebração, trabalho e preservação da natureza — dizem que o Guará pousa novamente sobre as águas, reluzente como uma promessa viva.

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